Eu Não Viralizo porque, ao contrário da maioria, não acho que a Academia do Oscar foi injusta nas suas premiações. Na verdade, acho que foi uma das vezes que o Oscar premiou de forma justa, eclética e positivamente política.
Vamos aos fatos: Fernanda Torres é, foi e sempre será uma atriz excepcional, “trabalhou intensamente” na construção de Eunice Paiva, segundo a preparadora do elenco, Helena Varvarki. Fernanda nos trouxe uma atuação cheia de sutilezas, realmente digna de um Globo de Ouro. Além disso, fez uma campanha elegante, cheia de classe e simpatia e humildade, para o filme no exterior. Sem dúvida, um orgulho nacional.
Fernanda Torres maravilhosa no Globo de Ouro
Fernanda Torres está perfeita como Eunice Paiva, mas, daí dizer que Mikey Madison é uma atriz jovem e principiante e não merecia o Oscar, is a big mistake. Tem sido dito que se não foi Fernanda Torres, deveria ter sido Demi Moore que fez um filme que combate o etarismo. Another mistake! Dizer que Mikey Madison não mereceu o Oscar porque é jovem é também etarismo. Nós mulheres estamos sempre sendo julgadas por “sermos muito jovens ou muito velhas para alguma coisa”. Quando eu era jovem cardiologista me perguntavam, “você tão jovem já é cardiologista? Já terminou a residência?”. Se fosse hoje, eu teria respondido “sou jovem e sou uma excelente cardiologista”. Perdi a chance. Quando engravidei de gêmeos aos 48 anos, eu “também era velha para parir, imagine gêmeos.” Aspectos biológicos à parte, sobrevivi ao etarismo e o meu casal de gêmeos fará 15 anos em abril.
Mas, voltemos ao Oscar. Anora, Sean Baker e Mikey Madison mereceram os prêmios. Eu assisti os filmes em que atuaram as três favoritas para melhor atriz: Demi, Fernanda e Mikey. As atuações são comparáveis, mas existe uma diferença significativa. Mikey é espontânea, expressiva, vibrante sem fazer esforço. Ela mostra emoções de uma forma tão natural que o expectador se esquece de Mikey e de repente só existe Anora. Mikey é um talento nato.
Mikey Madison, Sean Baker e elenco de ANORA no OSCAR
Antes de falar de Anora quero dizer que antes do Oscar, eu já tinha “cantado a pedra” de ele era meu favorito (post no meu Instagram), portanto não sou “engenheira de obra pronta”. Sobre Anora, para quem que diz que é um filminho para a sessão tarde, ou que explora demais a objetificação das trabalhadoras do sexo, lamento. Que pena que essas pessoas viram um outro filme, não o Anora que vi. Um filme com personagens cheio de camadas, com atores excepcionais, com uma mensagem político social importante. Sem dar spoiler, o filme fala de vulnerabilidade e invisibilidade social, de como as pessoas marginalizadas se acolhem ou disputam espaços, de como o valor venal tem o poder de discriminar os sentimentos dos menos favorecidos. E tudo isso, em um ritmo crescente de emoções e mudanças de perspectivas que as vezes até parecem comédia. Contudo, não o é. Além disso, Anora tem um final impactante e cheio de códigos subliminares. Na cena final, Mikey definitivamente mostra porque mereceu o Oscar.
Cena de Anora
Sean Baker, foi gigante, com um orçamento modesto, roteirizou, produziu e editou Anora. Ele mereceu o Oscar sim. Foi criativo, ousado e despretensioso.
O prêmio de Melhor Filme Internacional ganho por “Ainda Estou Aqui” foi justíssimo. É realmente o melhor na categoria. Esse prêmio foi o melhor para nós brasileiros. Ele foi ganho pela atuação de Fernanda, de Selton, pela direção de Walter Salles Júnior, por todos que atuaram, por Marcelo Rubens Paiva que escreveu o livro e sobretudo, esse prêmio foi ganho pela democracia e pela luta contra a ditadura. Somos todos vitoriosos!
Sobre as demais premiações, o Oscar foi político e premiou a diversidade em um momento de “trumpismo” crescente nos Estados Unidos. Zoe Saldaña, uma mulher negra dominicana ganhou atriz coadjuvante e diga-se de passagem, Zoe é a grande estrela de “Emília Perez”. Melhor figurino, pela primeira vez, foi ganho por um homem negro, melhor animação (curta) um filme iraniano. Flow, melhor filme de animação foi da Letônia, melhor documentário (No Other Land, “Sem Chão”, no Brasil) foi feito por um palestino e um israelita. O filme foi aplaudido de pé pelo discurso emocionado de Basel Adra, um dos diretores e ator. As premiações do Oscar mandaram muitas mensagens: “não apoiamos a ditadura”, “não apoiamos o genocídio em Gaza”, “em Hollywood existe espaço para diversidade e para outras nações”, e sobretudo “o mundo vai além do Estados Unidos”.
E viva Ainda Estou Aqui pela premiação inédita e merecida!
Cena de milhões! Fernanda Torres e Walter Salles Júnior após a premiação
Crônica inteligente e sensível, como a escritora,com feeling de cinéfila que previu o Oscar ,para Anora,indo na contramão da maioria...
Parabéns,Ana Marice, vc como sempre genial!!
Adorei o comentário e a premiação que, na minha opinião leiga e pouco entendida de cinema, honrou Central do Brasil, um filme que me marcou. Uma verdadeira "transmissao vertical" entre as Fernandas que finalmente chegou para a filha!